Se me pedissem uma palavra de conforto neste momento patético que estamos vivendo, esta seria calma. Como tenho dito em outros textos, é impossível cavalgar o caos. Isto não é uma frase de feito; é uma constatação.
A situação em que se encontra nosso planeta é mesmo trágica, e exige uma radical mudança de rota. Mas não nos iludamos, a força que bloqueia até mesmo a formulação de propostas é poderosa.
Tal força não é externa a nós; não atua no terreno da conspiração — esqueça isso, o conspiracionismo é um truque destinado a distrair nossa atenção.
O que confere poder a essa força é o enraizamento do medo (estado emocional resultante da consciência de perigo ou de ameaça, reais, hipotéticas ou imaginárias), aquele medo que está na origem da nossa espécie.
Primeiramente vamos tratar do truque: O que é uma conspiração? Do ponto de vista do interesse de um grupo de indivíduos mal-intencionados, é o encadeamento de uma trama de ações perfeitamente concatenadas, tendo por objetivo um determinado fim.
O ponto fraco dessa construção teórica são as circunstâncias, componente oculto cuja aleatoriedade e incontrolabilidade são propositalmente escamoteadas. Ou seja, o imprevisível desmonta e mata a trama.
Quero dizer que não há um agrupamento humano organicamente constituído e hereditariamente estruturado no controle dos destinos da Humanidade; um agrupamento cuja atuação se destinaria a manipular as grandes massas em benefício dos interesses de uma minoria.
Há sim, e sempre houve, a geração periódica de indivíduos expertos (místicos, cientistas, tecnólogos, guerreiros, políticos...), capazes de apontar caminhos ou produzir soluções adequadas às necessidades de determinado momento histórico, e a partir de suas iniciativas projetarem influência e/ou construírem fortunas. Estes se agregam naturalmente à estrutura de controle social de cada época, e colhem benefícios do sistema estabelecido pelo medo primordial.
É esse medo aquilo que nos governa, tanto os que têm muito quanto os que têm pouco, ou os que nada têm. Somos todos igualmente submetidos a esse temor atávico, inerente à nossa condição de seres soltos no espaço à espera de Godot, como já havia apontado Samuel Beckett.
Ter calma frente ao cenário desesperador que nos cerca e envolve é adquirir consciência de que o futuro está sempre em aberto. Embora ele seja, em grande medida, fruto das humanas ações do presente, nenhum indivíduo foi, é ou será mais do que um mero componente do turbilhão de partículas e eventos que constituem a realidade experienciada por nossa espécie.
Acalmar-se, no entanto, não é se conformar com a tragédia que nos cerca. É agir dentro dos limites impostos por nossas circunstâncias e estar atento às oportunidades de agir sempre melhor. Gostaria de encerrar com uma confissão registrada no início dos anos 1970:
Se eu tomo minha sopa
de noite
na cadeira de balanço do terraço
e os pensamentos passam,
não significa que eu estou feliz
com estes dias cinza chocolate.
Apenas me refaço.