A quem interessar possa

É comovente a crença que alimentamos — mesmo alguns de nós, que estamos dentre os céticos e/ou cínicos  sobre os valores desta civilização.

Talvez se trate mais de uma esperança, de um desejo ditado pelo nosso irremovível humanismo. Talvez.

E no entanto a realidade se apresenta de forma clara, sempre clara, não obstante os filtros desejosos que possamos usar para interpretá-la.

As ilusões que construímos nos envolvem como se camadas de uma cebola fossem. Mas são bolhas. Bolhas translúcidas, intercomunicantes.

Desde a mais interior — aquela que escapa da nossa anterioridade reptiliana governadora dos nossos medos —, desde a mais íntima dessas bolhas, repito, até a mais externa, o do gênero humano.

Ser, família, religião, epiderme, etnia, sexualidade, classe social, profissão... No interior de cada uma dessas bolhas adotamos os comportamentos correspondentes; assumimos as expectativas que nos cabem.

A intercomunicação entre elas nos proporciona a sensação de um ideal possível, concretizável, a qualquer momento alcançável. E com ele acalentamos nosso espírito.

Mas, qual o quê! Tudo, ao fim e ao cabo, revela-se um espelho de mentiras, meias verdades, truques psíquicos e sociais, aparências que fazemos questão de querer ver, acreditar e disseminar, retroalimentando crenças e esperanças.

Não está dando certo; há mais de 300 mil anos não está dando certo. E não dará certo, por mais séculos e milênios que dispusermos para perseverar neste modelo de civilização.

Como já disse em meu livro "Do que se fazem as salsichas" [cuja íntegra está postada neste blog], o gênero humano precisa ser educado para o Cosmo, e não para o mundo.

Constatar isto é libertador, mas também é um desespero. Parece que padeço de mansa loucura, e sobre ela falo sozinho, prego para o deserto.

E no entanto, como outros já disseram, é assim que são as coisas. Do universo e da nossa existência.