O petróleo e o nosso modelo de civilização

Um dos principais debates, hoje, no planeta, gira em torno da substituição dos combustíveis fósseis como fontes de energia. As posições têm sido sustentadas de forma apaixonada, especialmente quanto à continuidade de se utilizar hidrocarbonetos (petróleo, gás natural e hulha) como matriz energética. No Brasil, discute-se particularmente a conveniência da exploração do potencial petrolífero da margem equatorial (entre os estados do Amapá e Rio Grande do Norte).

As estimativas do Ministério de Minas e Energia (MME) do Brasil para essa área indicam um potencial de cerca de 10 bilhões de barris de óleo, com poder de gerar US$ 56 bilhões em investimentos, além de uma arrecadação da ordem de US$ 200 bilhões e criação de 350 mil empregos, conforme apurou o site "Migalhas".

De acordo com o 'perfil de refino' do Brasil, e dependendo do tipo de petróleo utilizado, de cada barril são produzidos 40% de diesel,18% gasolina, 14% óleo combustível (utilizado para aquecimento de fornos e caldeiras, ou motores de combustão interna para geração de calor), 8% GLP (gás de cozinha), 4% gasolina e querosene de aviação, 8% nafta (matéria-prima da petroquímica) e 8% outros.

Publicação encontrada no site da Petrobras sobre os derivados que fazem parte do nosso consumo cotidiano informa que as matérias-primas para os petroquímicos são a nafta e o gás natural (que se diferencia do GLP pela maior presença de propano em sua composição, cerca de 88%). Ainda de acordo com essa publicação, os petroquímicos são classificados como básicos, intermediários e finais.

Os básicos são eteno, propeno, butadieno, aromáticos, amônia e o metanol, a partir dos quais é produzida uma grande diversidade de intermediários. Estes, por sua vez, serão transformados em produtos petroquímicos finais como os plásticos, borrachas sintéticas, detergentes, solventes, fios e fibras sintéticos, fertilizantes, etc. A publicação detalha a aplicação industrial de alguns dos principais petroquímicos:

Eteno – seu principal derivado é o polietileno, que é usado na fabricação de sacos plásticos para embalagem de produtos alimentícios e de higiene e limpeza, utensílios domésticos, caixas d’água, brinquedos e playgrounds infantis. Dentre suas outras aplicações podemos destacar o PVC, usado na construção civil, em calçados e em bolsas de sangue.

Propeno – é a matéria prima para o polipropileno, usado, por exemplo, em embalagens alimentícias e de produtos de higiene e limpeza, peças para automóveis, tapetes, tecidos e móveis. Apresenta, além dessa, diversas outras aplicações como, por exemplo, produção de derivados acrílicos para tintas, adesivos, fibras e polímero superabsorvente para fraldas descartáveis.

Butadieno – usado principalmente na produção de borracha sintética, em pneus e solados para calçados, por exemplo.

Aromáticos – são matérias-primas para produtos como o PET utilizado em garrafas e fibras sintéticas, e o poliestireno, material empregado em eletroeletrônicos, eletrodomésticos, embalagens de iogurtes, copos, pratos e talheres e material escolar.

Metanol – é insumo para produção de biocombustíveis e de diversos intermediários químicos usados, por exemplo, pela indústria de móveis e de defensivos agrícolas.

Amônia – é uma das matérias-primas para a indústria de fertilizantes, sendo usada na produção de uréia e de fertilizantes nitrogenados utilizados nas culturas de milho, cana de açúcar, café, algodão e laranja, entre outras.

O conjunto de informações acima visa chamar nossa atenção para uma realidade inquestionável e dramática: os hidrocarbonetos, fornecidos pelo petróleo, a hulha e o gás natural constituem muito mais do que fontes de energia  eles são a espinha dorsal do modelo de civilização que temos desenvolvido desde meados do século XIX, para o bem e para o mal.

Investir na produção de energia limpa (hídrica, eólica, biomássica, geotérmica, maremotríz e até mesmo nuclear) é apenas uma parte do desafio civilizatório. Enquanto não forem encontradas alternativas (se é que elas existem) para a produção da infinidade de elementos químicos dos quais nossa sociedade depende  e não só os energéticos, insisto , os hidrocarbonetos não poderão ser descartados.

A mesma publicação do site da Petrobras, acima referida e linkada, nos informa: É praticamente impossível pensar o dia a dia sem a participação de algum produto obtido a partir da indústria petroquímica. Essa indústria (...) nos traz conforto e praticidade, sem que imaginemos quanta tecnologia e conhecimento estão envolvidos nas coisas mais simples. Existem produtos oriundos dessa indústria em roupas, colchões, embalagens para alimentos e medicamentos, brinquedos, móveis e eletrodomésticos, carros, aviões e cosméticos. Isso se deve (...) ao petróleo refinado em produtos que são a base para grande parte da indústria química.

Tendo essa compreensão em mente, só nos resta apoiar os esforços no sentido da aceleração do desenvolvimento de fontes energéticas limpas, ainda que, paradoxalmente, lançando mão de recursos advindos da exploração de fontes sujas, como o petróleo. E, seguramente, investir muito mais recursos, e de forma acelerada, na busca e desenvolvimento das matérias químicas imprescindíveis que hoje os hidrocarbonetos nos proporcionam. O resto é desinformação, hipocrisia, manipulação.